Everaldo Marques da Silva é hoje uma estrela dourada na bandeira do Grêmio, forma encontrada pelo então tricolor da Azenha para homenagear esse lateral esquerdo aplicado, eficiente e discreto que se consagrou tricampeão mundial de futebol pela seleção brasileira no México em 1970. A sua morte trágica, na noite de domingo, 27 de outubro de 1974, comoveu o povo gaúcho, o mesmo que o havia recebido em apoteose quando a seleção canarinho voltou do México trazendo consigo, em definitivo, a cobiçada Taça Jules Rimet. Único dos nossos no selecionado nacional, titular na lateral-direita quase de última hora em lugar de Marco Antonio, virou um ídolo popular acima das paixões clubísticas, motivo de orgulho em uma época em que os jogadores de futebol andavam nas ruas, não ganhavam milhões e nem andavam em Ferraris e Lamborguinis.
Foi, aliás, dirigindo um Dodge-Dart nacional que havia ganho de presente de uma concessionária de veículos, ao retornar da Copa, que Everaldo encerrou precocemente a sua vida, pouco mais de um mês depois de completar 30 anos de idade. E nem foi na Porto Alegre onde havia nascido e onde crescera e sim na terra do arroz, Cachoeira do Sul, a quase 200 quilômetros da capital. Com ele faleceram sua esposa Gleci, a filhinha Deise, de apenas 3 anos e, mais tarde, a irmã de Everaldo, Romilda, tripulantes de um automóvel lotado com sete pessoas. O culpado pelo acidente foi um motorista de Santa Maria chamado Vergílio, com 48 anos de idade e mais de 20 de profissão, casado, pai de três filhos, por ironia, um “gremista doente”, como diria mais tarde aos jornalistas. O caminhoneiro havia abastecido seu Mercedes-Benz, carregado com 24 toneladas de arroz, em um posto de gasolina à margem da BR-290 e retornou abruptamente para a rodovia, sem ver o Dodge que seguia no sentido de Porto Alegre. Eram 22 horas e 30 minutos de 27 de outubro daquele ano em que o Brasil apenas havia se classificado em quarto lugar na Copa vencida pela Alemanha, iniciando um jejum de títulos que duraria duas décadas.
Everaldo: estrela no pavilhão tricolor. |
O lateral-esquerdo impecável, o marcador cerrado da Copa de 70 nem sequer teve chance de desfrutar a sua aposentadoria – que na verdade já acontecera, precocemente. Everaldo, agora, pretendia trocar os gramados por uma cadeira na Assembleia Legislativa do Estado, pela Arena, Aliança Renovadora Nacional, o partido situacionista que disputava as eleições no próximo dia 15 de novembro. Para isso tinha ido a Cachoeira com a família, participar do jogo dos veteranos do Grêmio contra um time do colégio marista local, evento que lhe seria útil na busca de mais votos. Transmitida pela rádio local, a Princesa, a partida atraiu um grande público e terminou com 6 a 3 para o Grêmio, às 18 horas e 15 minutos. Everaldo teve uma atuação discreta, jogou além dos 15 minutos prometidos e meteu uma bola na trave. Depois participou de um coquetel, deu autógrafos, distribuiu a revista do Grêmio e santinhos da sua candidatura, visitou alguns amigos e partiu no seu “Dojão” amarelo de volta a Porto Alegre. Mal sabia que havia jogado o seu último jogo e fazia agora a sua última viagem.
Loivo, ponteiro esquerdo gremista, que o acompanhava como amigo e cabo eleitoral, foi o último colega de clube e profissão a falar com o ídolo tricolor. Abastecendo o seu Chevete no Posto Constante, no entroncamento da BR-153 com 290, Loivo gritou para o amigo: “Nos encontramos em Butiá para tomar uma champanha com os amigos”. Não deu tempo. (Pesquisa e texto: V. Minas)
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